E
agora?
Depois
de uma semana em que os Cidadãos se uniram sob o lema do repúdio e da
esperança, em que os níveis de expectativa cívica estiveram no seu máximo, por
estranho que possa parecer, a Democracia corre um sério perigo.
O
problema assenta na lentidão com que o Sistema Político de Governo assimila os “inputs”
cívicos, a sua proverbial dificuldade em os interpretar, a sua tendência para
os desvalorizar e a sua quase total incapacidade de funcionar, do ponto de vista
das respostas, com a mesma dinâmica das exigências cívicas.
O
Sistema Político de Governo vive um momento extraordinário porque está
confrontado com uma situação extraordinária: a sua quase total rejeição por
parte da maioria dos cidadãos.
É
evidente que o Sistema Político de Governo já se viu confrontado com outros
momentos de rejeição, mas desta vez a grande maioria dos contestatários são, precisamente,
aqueles que lhe serviram de suporte durante décadas.
Voltando
a Kuhn, vivemos um momento de ciência extraordinária em que o paradigma se transforma
e a ciência tradicional continua a julgar que é apenas uma anomalia a corrigir
com o tempo. Não é.
O
paradigma que se impôs nestes dias é outro.
Pela
resposta do Presidente da República percebemos que o Sistema Político de
Governo não percebeu nada. Ao não perceber condenou-se à sua destruição por
parte dos Cidadãos.
É
nesta condenação que reside o perigo principal para a Democracia, muito
especialmente para a democracia representativa.
A
democracia representativa para funcionar precisa sempre de uma enorme dose de
confiança cívica nas suas instituições e agentes. Uma confiança que permite que
através de um contrato sagrado uns poucos governem em nome de muitos.
Essa
confiança está completamente perdida e começam a surgir, por todo o lado, os
apelos à chamada democracia directa, em que as assembleias cívicas, por
maioria, determinam e agem sem intermediação.
Este
forma de a democracia funcionar é explosiva para a própria Democracia,
sobretudo por duas razões: o anular completo das minorias (forma-se uma
ditadura da maioria à Rousseau) e abre-se o espaço para a entronização de
caudilhos.
Não
há nada mais manipulável do que as massas e não há nada que tenha menos consciência
disso que as próprias massas.
A
rua de hoje será diferente da rua de ontem. A rua de ontem era uma rua em que
embora o repúdio pelo status quo fosse um denominador comum a esperança no
Sistema Político de Governo ainda existia. A rua de hoje é uma rua de repúdio e
uma rua sem esperança. Uma rua em que a permeabilidade à violência é enorme.
A
violência gera violência numa espiral incontrolável a não ser por uma força e
uma violência ainda maiores.
A
História, essa velha mestre, dá-nos muitos e muitos exemplos disso.
Vivemos
um tempo em que o desespero conquistou a rua e a estupidez dominou o Sistema
Político de Governo.
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